quarta-feira, 6 de outubro de 2010

igual, desprezível

todos os dias passo por mendigos aqui na Avenida Paulista. mas quero tratar de um específico, que fica pelo chão, se arrastando (nem sei se ele mora na rua mesmo), próximo ao metrô Brigadeiro. está sempre com uma caixa de papelão presa por um cordão no pescoço, pedindo moedas com a maior cara de lamento que alguém pode imaginar. tudo bem que um mendigo precisa de dinheiro, mas não mais que eu! ele tem tudo em mãos. não precisa planejar nada, não tem nada a perder e tem a moral que eu gostaria de ter. por que precisaria de mais de 10$ por dia para comer? isso eu aposto que ele ganha todo dia! e eu? tenho uma presente e futura vida regrada que precisa de muito dinheiro. ah, como eu sou consumista! levo comigo sonhos, que me levam com eles.
sempre que passo, olho para a caixa do sujeito. sempre com duas, três ou cinco moedas no máximo. (isso quando não tem nada.) como será que funciona seu faturamento? será que ele esconde ou gasta as moedas, dividindo o dia em períodos? sinceramente não sei. só sei que olho sempre para a caixa, mas nunca pra ele. nunca para os seus olhos, pois não tenho coragem. não tenho coragem de olhar para o lamento mais real do mundo. um metro e meio de realidade a cada quadra de mentira. não consigo, me deparar com toda essa realidade, e continuar meu dia. fujo, corro. tudo para não olhá-lo nos olhos. o evito, e o faço pensar que o desprezo, assim como todos que passam por aqui. não o desprezo, mas ele vai saber? a única conclusão que ele pode tirar é que o desprezo. ele é único pra mim, passo de lá pra cá e ele é o único no chão pedindo dinheiro. mas eu não sou único pra ele, passo lá e sou apenas mais um que não doa moedas a ele. apenas mais um que não o olha nos olhos, que não lhe dá carinho. mais um que vive sua vida numa coletividade totalmente individual.
a minha obsessão por igualdade me fez acreditar que mereço me foder assim como qualquer outro porco. porque a maneira como me comporto mostra que não passo de um deles.
julgava-me superior por acreditar -talvez cegamente, mas jamais inteiramente- entender as pessoas.
pessoas que vendem suas vidas para outros por acreditarem ter "motivos maiores". eu digo que o meu motivo é maior do que o delas. maior do que todos! mas é apenas meu, assim como o seu, é seu. e isso apresenta-me igual a todos.
sabe, essas coisas pairam pela cabeça, inferiorizar os outros (mesmo que só em sua própria cabeça, por preconceito) por diversos motivos, tal. mas ali, depois que passo pelo mendigo -sem olhar pros olhos dele-, percebo o quão desprezível eu sou. desprezível e igual. igual a todos que passam por lá. desprezível.

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